sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Chico Buarque do Brasil


-- Chico em 1968 --
por Fernando da Mota Lima – Chico Buarque do Brasil, volume publicado em 2004 e organizado por Rinaldo de Fernandes, é um dentre muitos títulos que celebram em tom consensual a trajetória artística e biográfica de Chico Buarque. Se ligeiramente consideramos a importância extraordinária de Chico Buarque na cultura brasileira desde meados dos anos 1960, torna-se dispensável reconhecer o significado de obras dessa natureza. Começo no entanto por ressaltar esse aspecto dominante da obra precisamente por acreditar que a atividade crítica deve ser sempre crítica, mesmo quando sua função é apreciar artistas em torno dos quais se articula a rede consensual apreensível na fortuna crítica de Chico Buarque, Tom Jobim, Caetano Veloso e outras raras e definitivas expressões da música e da cultura brasileira.
Embora contenha pouca documentação original, o volume tem o mérito de reunir dados biográficos e críticos relevantes e talvez ainda desconhecidos dos que pouco leem sobre música brasileira. É muito interessante, por exemplo, a documentação reunida na Cronologia. Penso em particular na matéria de uma entrevista que Chico concedeu a Augusto Massi. Nela ele revela fontes preciosas para que melhor se aprecie sua iniciação literária. De início, lê exclusivamente autores franceses sob sugestão do próprio pai, Sérgio Buarque. Pelo que se sabe, a partir de declarações do próprio Chico, Sérgio era um estudioso incansável e metódico. Certamente a mais forte evidência disso está contida na obra de historiografia que produziu, talvez a melhor que temos, também na sua fina erudição crítica espelhada na produção jornalística reunida em livro por Antonio Arnoni Prado. Embora tivesse família numerosa, sua biblioteca era pouco acessível à intrusão dos filhos, provavelmente controlados pela sombra eficazmente protetora de Maria Amélia, sua mulher.
O próprio Chico confessa que sua iniciação literária foi uma tentativa de encontrar uma via de aproximação com o pai demasiado imerso no seu mundo de livros e símbolos. É de certo modo curioso, ou mesmo incompreensível, o fato de Chico aportar afinal na literatura brasileira não através do pai, fonte capital de conhecimento histórico e cultural sobre o Brasil, mas através de um amigo que o reprovou por viver discutindo literatura… em francês. Diante do que sei de Sérgio Buarque através de sua própria obra, causa-me estranheza saber que ele afastou o filho da literatura brasileira, quando o mais razoável seria aproximá-lo. Afinal, ele foi um dos grandes participantes do mais importante movimento literário que já tivemos na história da nossa literatura. O modernismo, dando nome ao boi, teve abrangência infinitamente maior que a literária, ainda que compreendida aqui em sentido elástico. Sérgio confirma de resto, quando consideramos sua trajetória intelectual, este fato que vai aqui brevemente mencionado e melhor expus num artigo já postado no meu blog: Modernismo e Ciências Sociais.
A opção de artistas literariamente privilegiados como Chico Buarque e Caetano Veloso pela música constitui evidência do status intelectual que nossa música popular conquista a partir da bossa nova e sobretudo da contribuição estética e intelectual fundamentais que Vinícius de Moraes e Tom Jobim transportaram para o seu curso tão admiravelmente renovado e elevado a partir de meados dos anos 1950. O primeiro, como se sabe, procedia da tradição poética canônica, portanto restrita a um público altamente letrado, enquanto o segundo era portador de uma sofisticada formação musical erudita, embora vivesse catando moeda como pianista nos inferninhos da noite carioca para sobreviver. Além disso, o pai de Tom, assim como o de Vinícius, era poeta, ainda que retardadamente parnasiano. Este fato sugere o quanto é lenta a difusão dos grandes movimentos de renovação literária, mesmo no círculo das camadas letradas do qual ambos faziam parte.
Não fosse a mutação profunda sofrida pela música popular a partir desse período, jovens de formação privilegiada como Chico e Caetano teriam provavelmente derivado para outros campos de expressão cultural. O próprio Caetano sublinha bem essa circunstância. Como Chico, embora de extrato social inferior e preso na adolescência ao ambiente provinciano de Santo Amaro da Purificação, ele já lia autores literários de importância, já manifestava interesse pela filosofia e também já esboçara alguns passos de iniciação na crítica de cinema. Como ele próprio reconhece, foi a descoberta da bossa nova, antes de tudo da revolução estética introduzida por João Gilberto no cenário musical brasileiro, o que o atraiu para a música. A tudo isso se soma um fator de ordem sociológica importante, a expansão dos meios de comunicação de massa no momento em que a geração de Chico e Caetano ingressa no território musical.
Chico e Caetano tornaram-se amigos no início de suas carreiras. Mas logo a amizade foi estremecida pela própria turbulência estética e política que tão profundamente caracterizou a década de 1960, talvez a mais rica do século 20 brasileiro. É provável que somente a de 1920, desdobrada na década seguinte, lhe possa fazer páreo. A amizade foi abalada quando o tropicalismo irrompeu na cena musical em meio a uma extraordinária atmosfera de turbulência e radicalismo ideológico. A corrente dominante nos movimentos de esquerda era o nacionalismo cultural. Sua radicalização foi tão notável que mesmo representantes da bossa nova como Vinícius de Moraes e Carlos Lyra acabaram atraídos pela música engajada, pela regressão a temas que punham a música e a arte em geral na linha de frente do combate político à realidade social sustentada pelo regime militar. À parte Tom Jobim e João Gilberto, praticamente todos aderem a um movimento de regressão às fontes tradicionais da música e da cultura brasileira afastando-se assim da sofisticação camerística e liricamente apolítica da bossa nova. A pesquisa das fontes folclóricas e nordestinas, de braço dado com o sentido de engajamento político, prevalece na atmosfera agitada dos festivais de música que irrompem somando a celebração coletiva ao embate ideológico nas salas de espetáculo.
O tropicalismo provocou um autêntico curto circuito nas esquerdas, notadamente, por razões óbvias, na esfera musical. Como movimento que alimentou ambições muito amplas, é difícil traçar num artigo ligeiro suas linhas fundamentais. Ressalto aqui, tendo em vista minhas intenções específicas, sua associação com a vanguarda erudita identificável no movimento da arte concreta, liderado pelos irmãos Campos, Augusto e Haroldo, e por Décio Pignatari. Augusto, o mais afinado com a música, tanto a de vanguarda erudita quanto a popular, escreveu naquele momento uma série de artigos polêmicos, de alta tensão crítica, em defesa do tropicalismo. Esses artigos, acrescidos de outros assinados por Júlio Medaglia e Gilberto Mendes, seus companheiros de armas dentro da vanguarda erudita, visavam a defesa radical das mudanças introduzidas por Caetano Veloso e Gilberto Gil.
Os artigos, que compreendem ainda uma ótima apreciação geral da bossa nova escrita por Brasil Rocha Brito e entrevistas com Caetano Veloso e Gilberto Gil, foram mais tarde reunidos no volumeBalanço da Bossa. Este volume foi mais tarde ampliado e reeditado com o acréscimo de um subtítulo “e outras bossas”. Mesmo o leitor que dele em muitos pontos discorda, é o meu caso, curva-se à força dos fatos para reconhecer que é a melhor avaliação crítica da música à época produzida. Falando da minha experiência de leitor e amante da música brasileira, friso que muito aprendi com esse livro, decisivo para modificar e aprimorar um pouco minha percepção da música popular e das íntimas conexões que a atavam à realidade política e social daquele momento extraordinariamente turbulento e criativo.
Como é típico das vanguardas, o elogio da ruptura estética era indissociável do ataque às correntes opostas. Foi nesse contexto que Augusto de Campos identificou na música de Chico Buarque uma expressão conservadora que precisaria ser criticada sem complacência. Sendo assim, propõe uma relação de antagonismo personalizada em Caetano e Chico. Ampliando o elo das relações antagônicas para melhor definir as linhas de força da cultura brasileira a partir do modernismo, opõe Oswald de Andrade a Mário de Andrade. Estes constituíram as matrizes de um embate renovado na década de 1960 no tropicalismo liderado por Caetano em oposição ao nacionalismo conservador apreensível na música de Chico povoada por bandas, Carolinas e ecos nostálgicos do passado brasileiro.
Oswald de Andrade, que ficara confinado ao quase esquecimento durante duas décadas, é reposto na linha de frente dos movimentos artísticos que agitam a cena cultural nos anos 1960. Além do papel decisivo desempenhado pelos irmãos Campos, Haroldo e Augusto, outros focos de radicalização estética desencavam sua obra para acirrar o clima de irreverência, rebeldia e ruptura anárquica dos códigos dominantes. É o caso do Teatro Oficina, liderado por José Celso Correa, de Glauber Rocha na esfera do cinema novo, sobretudo do tropicalismo capitaneado por Caetano Veloso, que num certo sentido articula todas essas correntes contestadoras não apenas da cultura oficial guarnecida pela ditadura militar, mas também do nacionalismo de esquerda.
Os representantes da arte concreta, adestrados na polêmica e no combate agressivo a tudo que lhes parecesse conservador, reiteravam assim o sentido mais definidor da vanguarda. Na sua obsessão pelo novo sempre contraposto ao velho, da ruptura no avesso da rotina ou da repetição, viam novidade até onde ela não existia. Apostando no caráter potencialmente renovador dos meios de massa, que poderiam ser agenciados em defesa da ruptura estética e política, associaram-se não apenas ao tropicalismo, mas também à jovem guarda de Roberto e Erasmo Carlos, também de Vanderléa. Eles, os concretistas, que tanto combateram em prol da radicalidade da arte contemporânea, acabaram fabricando aliados inexistentes quando festivamente se integraram à corrente da arte de consumo promovida pelos novos meios de massa. E o fizeram batendo de frente contra o nacionalismo cultural de esquerda e de direita, aí incluída a figura consensual de Chico Buarque e sua música que, sem dúvida, soava conservadora se apreciada pelo metro formal e temático da tropicália.
Outro artifício de que Augusto de Campos se valeu foi o de adotar a tipologia procedente de Ezra Pound, que opõe os inventores, ou a radicalidade vanguardista, aos mestres e por fim aos diluidores. É fácil concluir que identifica Caetano e Gilberto Gil com a invenção, deprecia Chico como um mestre e silencia sobre os diluidores, salvo se os identifica com o grupo impreciso que repisa e dilui os clichês do nacionalismo cultural. Augusto de Campos tem certa margem de razão, mas muito do que combate, assim como muito do que prega, transborda da sua receita polarizadora e intransigente. Em suma, o senso de mediação crítica sai bastante chamuscado pelo ardor vanguardista que singulariza sua ação no âmbito da crítica da música popular.
Dando provas de grande vitalidade criativa, Chico se renovou de forma extraordinária sem abrir mão de sua coerência e fidelidade substancial à melhor e mais viva tradição cultural do Brasil. Quando isso se tornou evidente, o próprio Augusto de Campos voltou à cena do crime em tom mais contemporizador observando que Chico “é ainda um mestre mas se contaminou de invenção” Como seria previsível, atribui o ingrediente de invenção à influência saudavelmente contaminadora de Caetano Veloso. O artifício crítico constitui apenas uma variação da leitura que ele e seu irmão Haroldo fazem de Macunaíma quando subordinam a obra inventiva de Mário de Andrade ao espírito da antropofagia ideado por Oswald de Andrade.
Assentada a poeira da polêmica, logo ficou claro que a aposta dos vanguardistas no caráter de radicalidade da música integrada ao circuito do consumo de massa não passava de canoa furada. É certo que a jovem guarda continha elementos de inegável renovação cultural, à revelia da consciência ingênua dos seus líderes. O exemplo dos Beatles, repetidas vezes invocado por Augusto de Campos, é ainda mais forte. Eles sem dúvida renovaram a música de massa, o pop internacional de modo extraordinário. Mas tudo não passou de um episódio isolado no cerne de um sistema de produção e consumo de massa cuja dominante é a repetição, a diluição que tanta hostilidade inspira àqueles identificados com a vanguarda.
Quanto a Chico e Caetano, felizmente se reencontraram em termos pessoais acima dessas polarizações artificiais propostas por Augusto de Campos. A evidência maior da inconsistência desses antagonismos infundados, tão frequentemente promovidos pelos que personificam a rebeldia estética e a radicalidade das vanguardas, está inscrita antes de tudo na própria qualidade da obra musical que produziram dos anos 1960 ao presente. Um dos grandes méritos do tropicalismo consistiu precisamente no combate que moveu contra a intolerância estética e política traduzida em preconceitos contra a jovem guarda, o baião simbolizado em Luiz Gonzaga e até a nossa tradição brega, o mau gosto em geral, para usar aqui uma expressão bem vaga. Como todavia não vivemos isentos de preconceitos e apreciações duvidosas, o próprio tropicalismo entronizou na cena cultural um outro modo de preconceito, o que visa o nacionalismo cultural sem as discriminações devidas, o que opõe arbitrariamente a tradição à ruptura. Felizmente há muito foi superada a necessidade de os grupos de criação e recepção musical oporem esquematicamente Chico Buarque a Caetano Veloso.Posted: 02 Dec 2010 07:03 PM PST

terça-feira, 19 de outubro de 2010

AS CORES E SEUS SIGNIFICADOS-Por Arq. Iberê M. Campos

Uma simples mudança de cor pode alterar totalmente um ambiente, um humor, uma ação e, consequentemente, a vida das pessoas que frequentam aquele local. Segundo a Arquiteta Bianca Tognollo, especialista em cores e do marketing da Fademac, as tonalidades deve ter seu uso estudado não só na arquitetura e decoração mas também no mundo da moda, design e nas artes.
Bem, isto as mulheres já sabem há milênios e os publicitários e desginers gráficos usam e abusam das cores nas propagandas e embalagens para incentivar o consumidor a consumir os produtos. Em termos de arquitetura, quando se passeia por um ambiente, percebemos as cores presentes em uma parede, num copo de vinho, nos cabelos das pessoas, no vestido das mulheres e em todos os lugares, dando um formal, repousante ou estimulante ao local e às pessoas que lá estão.
É possível observar que a paleta de cores usadas na arquitetura sofre alterações influenciadas pelos interesses da sociedade. Observa-se que as mudanças nas cores, com o passar do tempo, podem ser intuitivas ou evolutivas. Algumas mudam radicalmente em resposta a modernidade, enquanto outras permanecem constantes por um tempo considerável.
Cores, significados e usos
Para cada finalidade, uma cor. Além do sentido figurado e oculto das cores, existem referências científicas ao que cada uma causa nas reações humanas. Este tema é muito extenso e daria origem a grandes coleções de livros. Como aperitivo, decifre um pouco do significado das cores e as reações que elas podem despertar nas pessoas, quando usadas nos ambientes.
Vermelho: Representa vida, atividade, energia. Cor mágica em muitas culturas, representa o sangue, a essência da vida. No Japão, crianças com catapora são mantidas em um quarto totalmente vermelho, vestidas com roupas vermelhas para apressar o processo de cura. É também um sinal de ódio e de energia que deu errado e resultou em crueldade, tendo por isto se tornado o símbolo de Satã. Por ser uma cor quente ela não é tão apreciada pela a maioria das pessoas. Pode ser usada em salas de estar, em detalhes ou para valorizar uma parede.
Laranja: As laranjeiras fornecem flores generosas. Tanto nas culturas ocidentais como orientais, suas flores são usadas pelas noivas como um símbolo de fertilidade. Em aromaterapia, o perfume da laranja é usado como calmante. Em arquitetura, o tom desperta o apetite e a ajuda a amenizar a dificuldade de comunicação. Traz aconchego, as pessoas que entram num ambiente com tons alaranjados tendem a se sentir acolhidas.
Amarelo: Os corpos dos aborígines australianos são pintados com ocre amarelo nas cerimônias funerárias. Na Idade Média tanto Judas como o Diabo eram representados vestidos de amarelo. A amarelo-ouro é o símbolo do Sol, significando o poder e a bondade de Deus, a auréola dos santos é dourada para mostrar a luz da vida eterna. Nos ambientes, o amarelo proporciona concentração, atenção. É excelente para ambientes onde serão desenvolvidas atividades intelectuais, como salas de estudo e escritórios.
Verde: Devido ao seu uso nas cerimônias pagãs, o verde foi banido pelos primeiros cristãos. A cor é muito usada nos hospitais com base na crença de que esta cor ajuda o processo de recuperação da saúde. Para os muçulmanos, o verde é sagrado e simboliza a imortalidade. Aplicada nos ambientes, enseja tranqüilidade, mas de forma ativa. Também provoca sensação de frescor e limpeza. Pode ser explorado em salas, cozinhas e banheiros.
Azul: O Deus dos Judeus ordenou aos israelitas que usassem um barrado azul em suas roupas No norte da Europa, por volta de 1600, um pano azul era usado no pescoço para evitar doenças. Culturas asiáticas acreditam que vestir ou carregar algo azul afasta o mau olhado. Diferente do verde, nos ambientes a cor azul provoca uma tranqüilidade passiva, É um tom altamente calmante.. Leva a uma introspecção profunda sendo ideal para ambientes onde as pessoas pretendem relaxar como quartos, salas de relaxamento e clínicas.
Violeta: Tom especialmente sagrado para as culturas romanas e egípcias nas figuras de Júpiter e Osíris. Associa-se às dimensões sagradas, justiça, diligência, nobreza de espírito, pensamento religioso, idade avançada e inspiração. Na China o violeta simboliza a morte e é a cor das viúvas. Suas várias matizes representam sofisticação e denotam espiritualidade. É uma cor preciosa, luxuosa e que pode ser usada, sem restrições, tanto em quartos como em salas.
Preto: Na Grécia antiga o preto simbolizava a vida porque o dia nascia da escuridão. Já para os antigos egípcios a negra lama do Nilo representava um renascer e os gatos pretos eram considerados duplamente sagrados. Este tom, que representa a ausência de cor ou de luz, demonstra poder e elegância mas deve ser usado numa elaboração bem feita.
Marrom (castanho): Nas culturas orientais acredita-se que o marrom incorpore toda a força natural do elemento terra. Na Idade Média era a cor designada aos camponeses, e portanto é associada à humildade. Nos ambientes, dá a impressão de algo sólido, seguro e calmo. Também pode ser associada a idéias de natureza, rusticidade, estabilidade, estagnação, peso e aspereza.
Branco: Pitágoras, o filósofo grego, acreditava que a cor branca continha, além de todas as outras cores, todos os sons. As tradições nipônicas consideram o branco a cor do luto. Para denotar inocência virginal, lírios brancos apareciam nas pinturas da Anunciação. Na Arquitetura e Decoração, o branco pode ser usado como cor neutra mas também para dar uma idéia de pureza, inocência, reverência, paz, simplicidade e esterilidade.
Cinza: Essa cor foi utilizada pelos povos primitivos para marcar as paredes das cavernas e reclamar seus domínios. É uma cor sombria, e foi utilizada pelas pessoas comuns durante o tempo de Carlos Magno, no século VIII.. Modernamente, o cinza é uma cor neutra mas que também pode ser usada para significar elegância, humildade, respeito, reverência e sutileza.
fonte: Instituto Brasileiro de Desenvolvimento da Arquitetura

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Nossa Senhora da Conceição Aparecida



Ó incomparável Senhora da Conceição Aparecida. Mãe de meu Deus, Rainha dos Anjos, Advogada dos pecadores, Refúgio e Consolação dos aflitos e atribulados, ó Virgem Santíssima; cheia de poder e bondade, lançai sobre nós um olhar favorável, para que sejamos socorridos em todas as necessidades.

Lembrai-vos, clementíssima Mãe Aparecida, que não se consta que de todos os que têm a vós recorrido, invocado vosso santíssimo nome e implorado vossa singular proteção, fosse por vós algum abandonado.

Animado com esta confiança a vós recorro: tomo-vos de hoje para sempre por minha mãe, minha protetora, minha consolação e guia, minha esperança e minha luz na hora da morte.

Assim pois, Senhora, livrai-me de tudo o que possa ofender-vos e a vosso Filho meu Redentor e Senhor Jesus Cristo. Virgem bendita, preservai este vosso indigno servo, esta casa e seus habitantes, da peste, fome, guerra, raios, tempestades e outros perigos e males que nos possam flagelar.

Soberana Senhora, dignai-vos dirigir-nos em todos os negócios espirituais e temporais; livrai-nos da tentação do demônio, para que, trilhando o caminho da virtude, pelos merecimentos da vossa puríssima Virgindade e do preciosíssimo Sangue de vosso Filho, vos possamos ver, amar e gozar na eterna glória, por todos os séculos dos séculos.

Assim seja!

Amém.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

QUASE SÓ PARA ELAS






JOÃO NUNES


Especial para a Gazeta

Há uma cena crucial em Comer Rezar Amar (Eat Pray Love, Estados Unidos, 2010), assim mesmo, sem vírgulas, de Ryan Murphy, que estreia hoje em Ribeirão Preto, quando a personagem central Liz (Julia Roberts) tem o momento decisivo da sua vida (e do filme): depois de comer e rezar bastante, ela encontra um grande amor —para completar a tríade de verbos do título—, mas recusa a se entregar a ele porque não quer perder o equilíbrio conquistado. Mas, afinal, por que rezar tanto, falar tanto em amor, buscar insistentemente o homem da sua vida se, quando está prestes a conquistá-lo, não tem coragem de encarar o novo desafio? De que valeu tamanho esforço se não é para desfrutar do resultado positivo dele?

Estamos pensando em termos práticos porque a personagem baseada no best-seller autobiográfico de Elizabeth Gilbert passa duas horas e vinte minutos em busca do "homem perfeito". Ela não se contenta que eles sejam bonitos (qualquer mulher ficaria feliz ao lado de Billy Crudup e James Franco) e escapa como se deles viessem todos os males da protagonista. E se os homens não trazem felicidade, que tal se encharcar da calórica comida italiana e ficar gorda a ponto de sofrer na hora de colocar uma calça nova? Ou se despencar para a Índia, passar privações como esfregar o chão, ficar em silêncio, meditar, rezar muito, enfim, viver uma vida de tribulações?

Simples: Liz é uma mulher cheia de culpas (e de dinheiro, para poder passar um ano viajando pelo mundo) e, antes de se entregar ao "verdadeiro amor" terá de passar por todas as dificuldades do mundo, como não se importar em comer demais e ficar feiosa ou tornar-se pouco desejável com aqueles vestidinhos de chita e cabelos descuidados enquanto limpa o chão de um mosteiro —perfeita caricatura de riponga.

Bem, só depois de passar por tantos sofrimentos (ainda que comer seja uma bênção, mas engorda o que para a mulher pode ser um grande drama) é que ela estará pronta para amar. E, mesmo assim, recusa porque pode perder o equilíbrio alcançado com tanta meditação. Contradições femininas? Ou o clima desejado para prender a atenção do espectador e leitor (no caso do livro)?

Comer Rezar Amar traz uma Julia Roberts pouco inspirada. Na verdade, a atriz é bem limitada, com duas ou três expressões que definem quase tudo, mas é capaz, por exemplo, de criar intensidade e simpatia suficientes num personagem como o da fotógrafa Anna, em Closer - Perto Demais (Mike Nichols, 2004).

No novo filme, ela é a Julia Roberts de quase sempre. Atua no automático, com cara de paisagem na maior parte do tempo e muito esforço na hora de sofrer. Ela só consegue ser simpática quando se solta e dá gargalhadas como alguém que se sente à vontade no papel. Quem se destaca mesmo como intérprete é o ótimo Richard Jenkins.

Fora isso, o filme carrega as tintas nos clichês dos respectivos países por onde a personagem passa. Os italianos, por exemplo, odiaram a forma como são mostrados: falam alto, comem muito, são dominados pelas mães e passam o dia infernizando a vida de mocinhas turistas, ao som de músicas mais que batidas.

Na Índia e em Bali as coisas não são muito diferentes: gente rezando, vacas na rua, trânsito insuportável, danças, sujeira e gurus ensinando a melhor maneira de se viver. Do Brasil, a coisa tampouco fica atrás. O personagem do espanhol Javier Bardem é o brasileiro Felipe, que insiste em beijar a boca do filho. Este reclama dizendo que os brasileiros são assim. E Javier, na pele de um brasileiro, é completamente ridículo. Fala com sotaque risível e tenta encarnar um amante latino típico que ouve bossa nova de João e Bebel Gilberto —pelo menos este clichê não fere tanto o que se conhece de melhor no Exterior a respeito do País.

Não será ofensivo dizer que Comer Rezar Amar é um filme direcionado totalmente para o público feminino, assim como fitas de guerra interessa mais ao masculino e desenho animado seduz crianças. Ressalvado o estereótipo e o conteúdo possivelmente pejorativo, talvez só as mulheres (e nem todas) curtam de fato esta história de descobrimento pessoal.

O NÚMERO

8,5 Milhões de livros vendeu Elizabeth Gilbert, com seu romance autobiográfico Comer Rezar Amar.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

O "ficar" pode ser uma indicação de dificuldade em lidar com rejeição


Muitos jovens são adeptos do “ficar” e, claro, jamais assumem relações sérias. Mas a busca desmedida dos prazeres imediatos, é preciso destacar, pode camuflar tanto insegurança quanto medos e conflitos internos mal resolvidos. O preço que pagam por esse comportamento impetuoso é que fazem escolhas afetivas erradas e vivem relacionamentos superficiais e insatisfatórios.


Foi-se o tempo em que os namorados dançavam música lenta. Nos dias atuais, o ritmo foi substituído pela acelerada batida tecno. Dessa forma, o toque suave na cintura foi trocado pelas "bundadas" do funk. Igual ao compasso da música, os jovens estão apressados e envolvidos em relações sem compromisso. Por trás desse comportamento, pode estar a recusa em aceitar a própria incapacidade de lidar com a solidão, além do medo da rejeição e insegurança. A pior conseqüência de viver dessa maneira é fazer escolhas afetivas erradas e se acostumar com uma vida de misérias emocionais.

Os solteiros em geral parecem estar alérgicos às frustrações e tristezas e não percebem a importância dessas emoções para refinar a personalidade. Assim, insistem em fugir desse desafio e se habituam a viver relações superficiais. O resultado é uma busca desenfreada da satisfação imediata a qualquer preço.

Resta perguntar: o que sobra em termos de afeto do que eles chamam "ficar"? Nada. São dois corpos e nenhuma intimidade. Relação afetiva saudável pressupõe enxergar, sentir, ouvir e processar o mundo interior do outro. Viver relações superficiais é uma armadilha e uma pseudofelicidade. Passado o efeito do uísque com energético e dos beijos descompromissados, os "ficantes" alugam os ouvidos de um amigo e reclamam de solidão, do descaso e da rejeição. Outros até têm uma pessoa fixa com quem se relacionam, mas parecem viciados em enxergar só o lado negativo do namoro estável.

Para esses, a relação afetiva é igual a um bolo. Só querem comer o recheio, ou seja, a parte boa, mas se esquecem dos outros ingredientes essenciais. Antes de assar havia farinha seca, ovo cru e gordura pura. Somente após passar pelo árduo calor do fogo, o bolo está pronto para ser consumido. O difícil é aceitar que nem a vida nem os bolos têm só os ingredientes preferidos. E isso não torna o caminho menos divertido, e sim mais desafiador.

Enquanto a pessoa viver a vida como se tudo fosse descartável, irá desconhecer o prazer de dormir abraçadinho e roçar os pés sob as cobertas. Em outras palavras, a troca de cumplicidade, o cafuné e o carinho. E assim perde a chance de descobrir o significado do amor.

Ser livre não é beijar na boca e não ser de ninguém. É ter coragem, ser autêntico e se permitir viver os sentimentos. Implica arriscar-se, pagar para ver e correr atrás da felicidade. Doar e receber. É compartilhar momentos de alegria e tirar proveito até das coisas ruins.

É claro que isso tudo demanda esforço. Para amar e ser amado é necessário o reconhecimento das diferenças, pois aquele que lidar melhor com as imperfeições do outro é o que sabe administrar as próprias limitações.

Não vale a pena procurar o amor em qualquer lugar ou pessoa. Isso não é compensador. Não adianta esconder-se atrás dos medos, pois nem sempre amar significa sofrer. Envolver-se com alguém implica a capacidade e a disposição de correr o risco de se lançar ao encontro do outro e desvendar a mais bela singularidade, como diz Roberto Carlos (69) na canção Emoções: "Se chorei ou se sorri, o importante é que emoções eu vivi!"


 Karine Rizzardi, psicóloga em Cascavel (PR) especialista em casais, família e em aconselhamento familiar, fez pós-graduação em Psicologia na Chicago University, em Chicago, nos Estados Unidos, e é membro da Associação Brasileira de Terapia Familiar (Abratef). E-mail: drakarinerizzardi@gmail.com

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

A todos que não foram e não ligaram-Fernanda Young

"Bom, você não foi. E não ligou. A mim, só restou lamentar a sua falta de educação. Imaginando motivos possíveis. Será que você não foi porque realmente não pôde ou simplesmente não quis? Será que não ligou para não me magoar ou justamente o inverso disso? Estou confusa, claro. Achava que você iria(...) Se você tivesse ligado do celular, eu seria fria. Se tivesse ligado do trabalho, seria levemente avoada. Se a ligação caísse, eu manteria a calma.(...) Foram muitos dias nessa tortura, então entenda que percorri todas as rotas de fuga. Cheguei a procurar notícias suas pelos jornais, pois só um obituário justificaria tamanha demora em uma ligação. Enfim, por muito mais tempo do que desejaria, mantive na ponta da língua tudo o que eu devia te dizer, e tudo o que você merecia ouvir, e tudo. Mas você não ligou. Mando esta carta, portanto, sem esperar resposta. Nem sequer espero mais por nada, em coisa alguma, nesta vida, para ser sincera. No que se refere a você, especialmente, porque o vazio do seu sumiço já me preenche; tenho nele um conforto que motivos não me trarão. Não me responda, então, mesmo que deseje. Não quero um retorno; quis, um dia, uma ida. Que não aconteceu, assim deixemos para lá. Estaria, entretanto, mentindo se não dissesse que, aqui dentro, ainda me corrói uma pequena curiosidade. Pois não é todo dia que uma pessoa não vai e não liga, é? As pessoas guardam esses grandes vacilos para momentos especiais, não guardam? Então, eis a minha única curiosidade: você às vezes pensa nisso, como eu penso? Com um suave aperto no coração? Ou será que você foi apenas um idiota que esqueceu de ir?"

Machado de Assis e o Xadrez

Xadrez e Leituras da Vida


“De Machado de Assis conhecemos parte
de sua vida

mas eu quero lhes dizer um pouco mais da
sua lida.

Além de poeta, romancista e contista

ele era teatrólogo, jornalista e enxadrista.” (ProfessorNelsonMS)

O segundo post da série Xadrez e Leituras da Vida apresenta a relação de Machado de Assis com o Xadrez. Este grande escritor brasileiro que nos deixou importantes composições escritas, também nos deixou suas composições para os tabuleiros de xadrez. Foi um jogador de xadrez e participou do primeiro torneio de xadrez realizado no Brasil. Mantinha contato com enxadristas e instituições afins. Jogou com grandes enxadristas da época como Artur Napoleão e João Caldas Vianna . Atuou, também, como problemista criando alguns problemas de xadrez.

Pesquisas mostram que a relação entre Machado de Assis e o jogo de xadrez se deu num intervalo de tempo de aproximadamente 36 anos (1862/1865 até 1898). Se essa relação não tivesse sido benéfica para Machado de Assis e para o xadrez, ela não teria durado tanto tempo !

A seguir são apresentadas citações que mostram Machado de Assis como enxadrista e a presença do xadrez em sua obra.

O nome de Machado de Assis recebe algumas citações relacionando-o ao xadrez :

“...Tinha aí duas distrações: a música erudita e o jogo de xadrez... “ (Machado : atual, imortal e eterno, Murilo Melo Filho - Sexto ocupante da Cadeira nº 20 na Academia Brasileira de Letras)

“Uma abertura machadiana | Aqui, jogaremos xadrez. A abertura fora do comum se justifica: os movimentos iniciais determinam o curso de uma partida e por isso na teoria enxadrística são objetos de intensa investigação. Aqui, também seremos investigadores. Uma importante característica da personalidade de Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908) ainda é pouco conhecida (porque pouco estudada): o inesgotável escritor, criador de alguns dos maiores clássicos de nossa literatura, foi um grande e dedicado enxadrista, habilidade peculiar que pode ter exercido uma enorme influência sobre o artista." C.S.Soares

“...Como o poeta romântico francês Alfred de Musset, Machado de Assis foi problemista e publicou vários de seus enigmas de xadrez em periódicos nas décadas de 1870 e 1880...” C.S.Soares

“Machado é citado como solucionista de problemas de xadrez em diversos números da revista Ilustração Brasileira e da Revista Musical e de Belas-Artes.” C.S.Soares

“Machado de Assis foi o primeiro solucionista da primeira secção de xadrez do Brasil ! Um problema de sua autoria foi publicado (sob o no. 10) na Illustração Brasileira e reproduzido, mais tarde, na Caissana, pág. 11. (Manual de Xadrez, Idel Becker)

DOYLE, Plínio. Machado de Assis, jogador de xadrez. In: Boletim da Sociedade dos Amigos de Machado de Assis. Rio de Janeiro, n. 1, pp. 22-23, setembro 1958.

MATHIAS, Herculano Gomes. Machado de Assis e o jogo de xadrez. In: Anais do Museu Histórico Nacional. Rio de Janeiro, Vol XIII, pp. 143-185, 1964.

Nas obras de Machado de Assis encontramos referências ao jogo de xadrez, eis algumas delas:

“Aos domingos, tinha sempre a jantar o Sr. Antunes, com quem jogava uma partida de bilhar. Tentou ensinar-lhe o xadrez, mas desanimou ao fim de cinco lições ... Das qualidades necessárias ao xadrez, Iaiá possuía as duas essenciais: olho de guia e paciência beneditina; qualidades preciosas na vida, que também é um xadrez, com seus problemas e partidas, uma ganhas, outras perdidas, outras nulas. “ (Iaiá Garcia, Machado de Assis)

“Por outro lado, há proveito em irem as pessoas da minha história colaborando nela, ajudando o autor, por uma lei de solidariedade, espécie de troca de serviços, entre o enxadrista e os seus trabalhos. Se aceitas a comparação, distinguirás o rei e a dama, o bispo e o cavalo, sem que o cavalo possa fazer de torre, nem a torre de peão. Há ainda a diferença da cor, branca e preta, mas esta não tira o poder da marcha de cada peça, e afinal umas e outras podem ganhar a partida, e assim vai o mundo. Talvez conviesse pôr aqui, de quando em quando, como nas publicações do jogo, um diagrama das posições belas ou difíceis. Não havendo tabuleiro, é um grande auxílio este processo para acompanhar os lances, mas também pode ser que tenhas visão bastante para reproduzir na memória as situações diversas.” (Esaú e Jacó, Machado de Assis)

"Quando Eduardo declarou aceitar a partida de xadrez a moça sentiu que o coração lhe palpitava com mais força. Ela própria foi dispor o necessário para o jogo, não sem levantar muitas vezes os olhos para Eduardo, cujo olhar, pregado nela, exercia uma fascinação ... Mandou entrar e daí a pouco o valente jogador de xadrez aparecia à porta, com ar risonho e gesto afetuoso.” (Questão de Vaidade – conto, Machado de Assis)

"O major jogava o xadrez com Valadares; o poeta recitava versos; Elisa enchia tudo com a sua graça e as suas palavras." (História de uma Lágrima – conto, Machado de Assis) | Boa “leitura” e bom “jogo” !


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quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Festa no outro apartamento-Martha Medeiros

Anos atrás a cantora Marina compôs com o irmão dela, o poeta Antônio Cícero, uma música que dizia: "eu espero/acontecimentos/só que quando anoitece/é festa no outro apartamento". Passei minha adolescência inteira com esta sensação: a de que algo muito animado estava acontecendo em algum lugar, porém eu não havia sido convidada.

Até aí, nada de novo. Não há um único ser humano que já não tenha se sentido deslocado e impedido de ser feliz como os outros são - ou aparentam ser. O problema está em como a gente reage a isso. A grande maioria que espera "acontecimentos" fica ligada demais na festa do vizinho, se perguntando: como fazer para ser percebido? A resposta deveria ser: percebendo-se a si mesmo. Mas é o contrário que acontece: a gente passa a se vestir como todo mundo, falar como todo mundo, pensar como todo mundo. Só então consegue passe livre: ok, agora você é um dos nossos, a casa é sua.

As festas em outros apartamentos são fruto da nossa imaginação tão infectada por falsos holofotes, falsos sorrisos e falsas notícias de jornal. As pessoas alardeiam muito suas vitórias, mas falam pouco das suas angústias, revelam pouco suas aflições, não dão bandeira das suas fraquezas, então fica parecendo que todos estão comemorando grandes paixões e fortunas, quando na verdade a festa lá fora não está tão animada assim.

É preciso amadurecer para descobrir que a grama do vizinho não é mais verde coisíssima nenhuma. Estamos todos no mesmo barco, com motivos pra dançar pela sala e também motivos pra se refugiar no escuro, alternadamente. Só que os motivos pra se refugiar no escuro não costumam ser revelados. Pra consumo externo, todos são belos, lúcidos, íntegros, perfeitos. "Nunca conheci quem tivesse levado porrada/todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo". Fernando Pessoa sacando que nada é o que parece ser.

Sua solidão, sua busca por paz interior, seus poucos e leais amigos, seus livros, suas músicas, fantasias, de desilusões e recomeços, tudo isso vale ser incluído na sua biografia, e pode ser mais divertido que uma balada em algum lugar distante. Pegar carona na alegria dos outros é preguiça, e quase sempre é furada. Quer festa? Promova-a dentro do seu apartamento.

Martha Medeiros

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Ele não está tão afim de você...

Levou um tempo, mas eu aprendi. É verdade mesmo. Não ligou porque não quis ligar. Não enviou e-mail porque não quis enviar. Não mandou SMS porque não quis mandar.

Quanto tempo você leva pra ligar, enviar um e-mail ou SMS só pra dizer "e aí, tudo bem? nossa, tô trabalhando demais/ tô estudando demais/ minha mãe está aqui em casa/ tenho campeonato esse fim de semana/ O celular não pega lá/não vou levar o notebook/tenho palestras no fim de semana...
Então é assim que funciona. Ele não tá a fim de você. Mesmo.

Das poucas vezes em que quis que ficasse claro e reiniciei o contato depois de um sumiço, a única coisa que ganhei foi...Não posso falar com você agora te ligo mais tarde...e sumiu...rs.

E sempre quando eu ligo ele me diz...uai você sumiu...só eu??

Tenho saudades quando agente se falava todo dia.
E olha que não havia acesso a tanta tecnologia.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Transformando um pé na bunda em arte - por Vanessa Souza


Recebi uma carta de rompimento.
E não soube respondê-la.
Era como se ela não me fosse destinada.
Ela terminou com as seguintes palavras: “cuide de você”.
Levei essa recomendação ao pé da letra.
Convidei 107 mulheres, escolhidas de acordo com a profissão, para interpretar a carta.
Analisá-la, comentá-la, dançá-la, cantá-la. Esgotá-la.
Entendê-la em meu lugar. Responder por mim.
Era uma maneira de ganhar tempo antes de romper.
Uma maneira de cuidar de mim.

São com essas palavras que a artista plástica e escritora francesa Sophie Calle justifica sua exposição “Cuide de você”. Após levar um fora por e-mail do também escritor – e sedutor – Grégoire Bouillier, não sabendo ser aquele um adeus definitivo, ou se haveria ainda uma porta aberta, e não tendo coragem de responder a mensagem, ela decidiu, três dias depois, mostrar a carta-rompimento para 104 mulheres das mais diferentes profissões para interpretar o texto — psicanalista, juíza, escritora, jornalista, atriz, cantora, consultora de etiqueta, delegada, jogadora de xadrez…

O resultado incrível desse projeto esteve no SESC Pompéia, em São Paulo, e de 22 de setembro a 22 de novembro estará no Museu de Arte Moderna da Bahia, em Salvador. (O e-mail de Grégoire está reproduzido ao final deste post.)

“Se ele tivesse voltado, eu teria preferido Grégoire”, disse Sophie na FLIP 209. Mas ele não voltou. E a exposição está fazendo o maior sucesso. Ainda na FLIP, Grégoire, no primeiro encontro oficial com Sophie, lembrou aos literatos que não é proibido deixar alguém, e que todos têm o direito de amar e deixar de amar. Tudo bem, Grégoire, você teve todo o direito, ok?

Em junho deste ano, o escritor explicou à revista Marie Claire que a fidelidade exigida por Sophie deveria ser algo oferecida de livre e espontânea vontade. Não pode ser pedida, nem exigida. “Tem que partir de você, não do outro. No meu caso, ela se tornou um fardo quando passou a ser uma obrigação que a Sophie impunha, não uma vontade natural”, explicou. No final da entrevista, ele alfinetou a ex. “Gostei muito de Sophie, mas, na verdade, tive outros relacionamentos que foram até mais importantes na minha vida”.

Voltemos à exposição. Algumas das interpretações se destacam. A subeditora-chefe, Sabrina Champenois, escreveu: “O inferno, sem os outros. Amante rompe e afirma que motivo é respeito pelo pacto inicial. Honestidade ou covardia?”

A juíza X., que não quis se identificar, pergunta-se: “O que é um contrato? É um acordo voluntário entre duas pessoas, cujo consentimento deve ser livre e ciente, para criar certa situação e organizar de forma precisa as regras segundo as quais funciona”.

Françoise Gorog, psiquiatra, usa um lacanês só compreensível para psicanalistas (ao lado). A escritora de cartas Rafaèle Decarpigny é enfática: “(…) Eu poderia expressar incompreensão, tristeza, raiva. Poderia lhe dizer que apenas o fato de responder essa mensagem seria demonstrar interesse demais. Poderia lhe dizer que poderia ter preferido uma ‘boa conversa aberta’ (?) a essa prolixidade na qual você mergulha, como que para esconder a sua evasão e as ‘razões’ para ela”.

A Condessa Aliette Eischer Von Toggenburg (ao lado), consultora de etiqueta e protocolo, desdenha o e-mail, do início ao fim. Quando Grégoire escreve que gostaria que as coisas tivessem tomado um rumo diferente, ela dispara: “Sim, claro, culpe a sua mãe, o padre, o presidente, a Madonna, ter lido Don Juan, os tumultos na periferia e sei lá mais o quê”.

Para concluir, a interpretação da criminologista Michèle Agrapart-Delmas. Para ela, o autor do e-mail é incapaz de lidar com seus conflitos, sua escrita é evasiva, e ele quer projetar a imagem de uma pessoa bondosa que não sabe repelir. É somente a angústia, pela qual ele não pode ser responsabilizado, que o leva a escrever essa pequena obra de manipulação e dominação, além do autor ser orgulhoso, narcisista e egoísta. “Não há dúvidas de que a mulher para quem ele escreve o lisonjeava, mas ele não dá a mínima para seu sofrimento, para a frustração produzida pela dor que ele causa”.


São muitas as outras leituras do e-mail, outras tão instigantes quanto às citadas aqui. Vale muito conferir a exposição. Dói um pouco, também. Você já levou um fora por e-mail? Sim? Então faça como a Sophie e sublime. Sublime bem. É a melhor saída. Ah! Sophie disse que a exposição foi uma maneira de ganhar tempo antes de romper com Grégoire. Ela não havia entendido que, embora unilateral, o rompimento já havia ocorrido?


—–
O e-mail em que Grégoire Bouillier rompe com Sophie Calle

Há algum tempo, venho querendo responder seu último e-mail. Na verdade, preferia dizer o que tenho a dizer de viva voz. No entanto, vou fazê-lo por escrito.

Você já pôde notar que não estou bem ultimamente. É como se não me reconhecesse em minha própria existência. Sinto uma espécie de angústia terrível, contra a qual não consigo fazer grande coisa, exceto seguir adiante para tentar superá-la. Quando nos conhecemos, você impôs uma condição: não ser a “quarta”. Eu mantive o meu compromisso: há meses deixei de ver as “outras”, não achando logicamente um meio de vê-las sem transformar você em uma delas.

Pensei que isso bastasse. Pensei que amar você e que o seu amor — o mais benéfico que jamais tive — seriam suficientes. Pensei que assim aquietaria a angústia que me faz sempre querer buscar novos horizontes e me impede de ser tranquilo ou simplesmente feliz e “generoso”. Pensei que a escrita seria um remédio, que meu desassossego se dissolveria nela para encontrar você. Mas não. Estou pior ainda; não tenho condições nem sequer de lhe explicar o estado em que mergulhei. Então, nesta semana, comecei a procurar as “outras”. Sei bem o que isso significa para mim e em que tipo de ciclo estou entrando. Nunca menti para você e não é agora que vou começar.

Houve uma outra regra que você impôs no início de nossa história: no dia em que deixássemos de ser amantes, seria inconcebível para você me ver novamente. Você sabe que essa imposição me parece desastrosa, injusta (já que você ainda vê B., R.,…) e compreensível (obviamente…). Com isso, jamais poderia me tornar seu amigo. Você pode, então, avaliar a importância de minha decisão, uma vez que estou disposto a me curvar diante de sua vontade, ainda que deixar de ver você e de falar com você, de apreender o seu olhar sobre os seres e a doçura com que você me trata sejam coisas das quais sentirei uma saudade infinita. Aconteça o que acontecer, saiba que nunca deixarei de amar você do modo que sempre amei desde que nos conhecemos, e esse amor se estenderá em mim e, tenho certeza, jamais morrerá.

Mas hoje seria a pior das farsas manter uma situação que, você sabe tão bem quanto eu, se tornou irremediável, mesmo com todo o amor que sentimos um pelo outro. E é justamente esse amor que me obriga a ser honesto com você mais uma vez, como última prova do que houve entre nós e que permanecerá único.

Gostaria que as coisas tivessem tomado um rumo diferente.

Cuide-se.

Grégoire

crédito das fotos: a primeira é do site da Flip.
as outras duas são de Vanessa Souza, a partir
das peças expostas em São Paulo